Patrimônio de Nossa Senhora da Abadia, na zona sul, é o primeiro bairro de Uberlândia surgido após a formação do núcleo inicial localizado no Fundinho. Em 1883, o fazendeiro e devoto de Nossa Senhora da Abadia, José Machado Rodrigues, doou 12 alqueires de terra à igreja, que anos mais tarde vendeu os terrenos a preços irrisórios, principalmente para a população negra.
Com a abolição da escravatura, em 1888, coincidentemente no mesmo ano de emancipação de Uberlândia, cresciam os núcleos negros das cidades. Recém-saídos das senzalas e sem condições mínimas para seguir a vida, os antigos escravos vendiam sua força de trabalho nas fazendas onde um dia moraram. Outros se mudaram após serem excluídos do bairro Fundinho. Por isso, por muitos anos, o Patrimônio foi considerado uma área marginalizada.
Mestre Bolinho, apelido do carnavalesco João Rodrigues, é bisneto de escravos e nascido há 79 anos na rua General Osório, hoje avenida Francisco Galassi, no bairro Patrimônio, de onde nunca saiu. Ele conta que o bairro era cheio de ranchos de pau a pique e pés de fruta, onde os moradores matavam a fome. “Não tinha ruas e a gente andava em trilheiros, igual formiga. Na década de 40 e 50, as pessoas tinham até medo de vir aqui. Era terra de negro”, conta.
As condições dos primeiros moradores mudaram um pouco, depois de inaugurada a Charqueada Omega, em 1922, pioneira no mercado de charques (carne seca) em Uberlândia. A empresa, de sociedade entre Nicomedes Alves dos Santos e João Naves de Ávila, doou 12 terrenos para os funcionários mais antigos. Entre eles, o pai de Mestre Bolinho. O lote ficava onde está hoje o bairro Jardim Karaíba, mas com a morte do patriarca da família, a mãe vendeu a área e comprou no vizinho Patrimônio, para ficar mais próxima da família. “Já pensou a gente com um terreno no Karaíba hoje? Mas nunca quero sair do Patrimônio. Nasci aqui e é aqui que eu vou morrer”, afirmou Bolinho.
Outro marco para o crescimento do Patrimônio foi a criação, em 1935, do Praia Clube, na época, sem a pretensão de ser um dos maiores da América Latina. O espaço surgiu porque havia um grupo de frequentadores das terras do Coronel Constantino, que usavam parte do rio Uberabinha para nadar. Com a implicância de alguns genros do fazendeiro, uma turma comprou um pedaço da terra por 35 contos de réis. O nome Praia foi dado por causa de uma praia de cascalho que havia no local e as cores amarela e preta foram sugeridas por um dos sócios fundadores, Roman Balparda, torcedor fanático do Peñarol, do Uruguai.
Pouco tempo depois, o que era inacreditável na época, aconteceu, e o rio Uberabinha não limitou mais a cidade. Em 1949, a loteadora ITV Urbanismo criou o bairro Tubalina do lado de lá do curso de água e a cidade expandiu para zona oeste e sul, dando oportunidade para pessoas com menor renda de adquirir um terreno no que é hoje considerada a região mais privilegiada e em maior crescimento de Uberlândia.